21 dezembro 2008

O Rei dos Insetos / Chloronia corripiens

Está descoberto o inseto que desde 2008 estavamos sem saber. Graças ao professor Rafael, que postou o comentário abaixo. Grato!

14 dezembro 2008

Negrinho-do-mato reclama status

Um Negrinho apareceu na Reserva. Apressado, reclamava do estado em que se achava certa questão. Estava na Lista das Aves Ameaçadas de 2008.
É parente do Bicudo, do famoso Curió, do cantado Azulão, do valoroso Tia-chica e do tadinho do Coleirinho, todos procurados pelo Komércio Clandestino de Aves Silvestres (K-LAS). Irônico? Tem mais.
Poderia ser um dos sortudos livres e anônimos, que cumprem seu papel na cadeia aberta e caótica da Natureza. Eu disse Natureza? Pois bem, o Negrinho está sendo ameaçado por tabela, justamente por não ter mais abrigo na Natureza, como tantos outros.
Vendo o Negrinho, repare bem no bico, é parecido com o do Coleirinho e do Curió. Vive de grãos, a dois e três metros do solo e os filhotes comem de tudo. O Tico-tico, por exemplo, outro parente-granívoro, alimenta a prole exclusivamente com artrópodes.
Durante a reprodução vive como um casal, fiel entre eles e a um território. Nas lutas e na corte, arrepia as penas, vibra intensamente as asas e mostra a parte branca que tem debaixo delas. Move para baixo e para os lados, e estanca a cauda em qualquer posição. Legal, é?
Vive no interior de densa Floresta Secundária e de Araucária, no Brasil, Paraguai e Argentina (Misiones).
A fêmea é marrom e pode passar pela fêmea de um Curió. Que perigo!
A Gabi pegou o canto, eram duas estrofes, mais ou menos assim:

Sem mato, tem passarinho? Tem n’sinhÔ.
Com mato
tem passarinho? Si tem si’sinhÓÓÓ!

Hermeto cria Música.

Emberezidae - 13cm Amaurospiza moesta (macho) - Blackish-blue Sedeeater
Photo © Renato Rizzaro - Fonte: Helmut Sick e Save Brasil

12 dezembro 2008

No tempo do banho de mangueira

Esticamos cem metros de mangueira e ligamos diretamente na cachoeira. O jato que saía era fortíssimo e, assim, por algum tempo tivemos banho ao ar livre e, de quebra, lavamos a casa por dentro e por fora, aliás, uma história à parte. O Areni e a Enia, antigos moradores da Furna, nos trouxeram esta mangueira numa visita. Vieram nos ajudar a dar um "banho" na casinha, uma vez que não iríamos mesmo derrubá-la, como mais de uma vez nos foi sugerido e, sim, habitá-la imediatamente, do jeito que estava. Trouxemos alguns carpinteiros para orçar a reforma, porém, desistíamos toda vez que mostravam a conta e, invariavelmente, depois do conselho: é melhor derrubar, gastarão menos dinheiro do que reformando. Acontece que o encanto da casinha era tamanho, que resolvemos iniciar uma reforma por conta própria. E, assim, contra tudo e todos, trabalhamos durante o ano de 2001 inteirinho, reaproveitando desde madeiras de ranchos abandonados a mourões, recolhemos sobras de madeiras em obras na Ilha de Santa Catarina e assim, descobrimos cada madeira! Tarumã, cedro, ipê, canela-sassafrás, araucária... eternos mourões, estacas e ripas. Poucos acreditaram que concluiríamos a reforma e muito menos, que morarímos na Reserva. E lá se vão quase oito anos. Agora, banho gelado é ritual de verão, porque no inverno nossa ducha é de cascata encanada que dá voltas no “trombone” (a serpentina que instalamos no fogão a lenha) e sai escaldante na cozinha e no banheiro.

Bendita tempestade!
Durante o início da reforma fomos surpreendidos por uma tempestade que arrancou pontes, estourou açudes, desmoronou barrancos e rasgou o solo. Ficamos sem estrada por muitos dias e os antigos moradores juraram que nunca haviam visto nada igual, pois foram surpreendidos pela tempestade enquanto faziam uma visita aqui na Reserva e tiveram que esperar passar para voltarem, passando amarrados em cordas através da imensa cratera onde antes havia uma ponte.
Junto com o aguaceiro veio uma enorme quantidade de pedras que entupiu o bueiro ao lado de casa e deixou a gente em pânico. Passado o terror - e a chuva - começamos a transportar as pedras para dentro de casa e concluímos que nada, mas nada mesmo, acontece por acaso. Com as pedras que rolaram, assentamos o piso da cozinha, do banheiro, da varanda, fizemos degraus, paredes e ainda sobrou para rechear o fogão a lenha. Hoje em dia, temos dois quartos de hóspedes onde recebemos amigos, observadores de aves e pesquisadores, que até então, gostaram muito do que viram e da convivência com este casal de malucos, que resolveu morar no meio do mato, sem TV, rádio ou jornal.
Ah, apareceu Internet por antena, o que é bom, pois podemos enviar estas pequenas histórias para serem conhecidas no espaço virtual.

28 novembro 2008

Uma cobra assanhada


6 de fevereiro de 2005, tudo pronto para sair. A derradeira olhada pra ver se não esqueceu nenhuma coisa ligada, tralha na mão, fecha tudo, aquela última passadela no banheiro e... olha quem a gente encontra no recanto da leitura: uma folgada, e até então desconhecida, cobrinha. Esquece viagem, descarrega tralha, abre porta, pega equipamento, lentes e vamos cobrir o acontecimento, pois esta cobrinha já estava na mira há tempo, pois havia deixado várias roupas dependuradas no telhado do rancho e agora resolveu aparecer. Não tinha melhor horário?
Não tinha e foi a melhor coisa que fizemos, um ensaio de três horas com a nossa ilustre desconhecida.

No começo até ficamos um pouco assustados, afinal, passava do metro o tamanho da bichinha e olha, andava pra tudo quanto é canto, o que será que ela estava querendo por ali? Sabia-se ainda não.

Pegou o rumo da janela do banheiro e subiu para o telhado com tamanha agilidade que ficamos impressionados. Depois vasculhou alguma brecha, queria porque queria, entrar no forro, acreditamos que seria para se esconder da gente, puro engano, pois veio em nossa direção e desceu numa quina da casa até o chão e logo subiu na mesa. Foi quando deu pra ver o quanto era grande a danada. da mesa, fez algumas contorsões, mas não conseguiu se agarrar em nada, voltando para o chão.

Dali subiu no tratador e apontou para a bracaatinga, esforçando-se ao máximo para alcançar algum galho, o que não deu também. Nessa altura dos acontecimentos já havia uma balbúrdia em volta da cobra e da gente, tinha sabiá, coleirinho, canarinho, tia-chica, bentevi, e uma curreca movimentando-se freneticamente para todos os lados. Aí, entendemos o caso. A cobrinha queria porque queria alcançar o ninho da tal curreca que estava instalado dentro de um bambu, num local muito bem protegido, abaixo do beirado da nossa casa. Entendemos tudo, no momento em que ela conseguiu subir na bracaatinga e foi até o galho mais próximo de onde estava o ninho, com filhotes, claro!
Formou-se uma espécie de arena, nós na janela da casa e os pássaros todos em volta da cena, alguns absolutamente compenetrados nos movimentos da curreca que, bravamente, se atirava em cima da cobra, tentando atingir sua cabeça. Mas a cobra, certa do seu poder, nem aí, queria mesmo era lanchar os filhos da curreca.

Desceu mais uma vez ao solo e foi tentar subir por algum vão por baixo da casa. Êpa, peraí, se acha um buraco no assoalho (e tinham alguns) eu não iria gostar nada, nada. Então entrei na briga. Pegamos um cesto e fomos tentar botar a bichinha para dentro, para poder levá-la longe dali. Entrou no cesto, mas saiu ligeirinho, peguei um ancinho para que ela subisse, numa nova tentativa de levá-la dali, aí ela parou, olhou para mim e chacoalhou o rabo feito cascavel. Levantou poeira do chão, estava brava, mais do que nós, certamente, pois estávamos impedindo o seu lanchinho. Recuei, disse está bem, não te cutuco mais, agora deixa a curreca em paz! Qual nada, veio para cima da gente e entramos para dentro de casa, olhando e fotografando, meio amedrontados, pela janela da cozinha. E agora? Já caminhava para baixo da casa novamente, quando de repente, assim, sem mais nem menos, ela dá um pinote, quer dizer, zarpa dali, como um chicote, correndo pela grama a mil por hora e ficamos assim, admirados olhando um para o outro, sem entender mais nada, mesmo!
Não demorou muito, descendo suavemente, como uma fadinha, apareceu um lagartão lambendo os beiços, dono absoluto do pedaço. A curreca voltou a cantar e nós pudemos sair, felizes da vida, com as fotos, o lagarto e a cobrinha, que certamente foi procurar seu lanche em outras paragens, embora tenha deixado outras histórias. Bom, fica para depois.

26 novembro 2008

Ratos, cabaça e vespas


No início da primavera de 2004 aconteceu a ratada, um fenômeno que acompanha o florescimento da taquara, uma vez a cada 30/35 anos. Na Reserva pudemos observar tudo desde o início, e foi assim...
Uma malha de taquara no meio da floresta começou a amarelar e um vizinho imediatamente falou, sem pestanejar: pode se preparar que lá vem ratada! Ratada?! Como assim? É só começar a amarelar a taquara que os ratos vão aparecer aos milhares, pode ter certeza! Naquela época estávamos cursando as primeiras aulas de Biologia, como alunos ouvintes, na UFSC e o nosso mestre na Botânica era o Ademir Reis. Claro, levamos o caso para a aula e ele sabia da existência mas não havia tido contato direto com o caso, ainda, o que deixou todo mundo ouriçado. Era muito cedo e os ratos não haviam começado a dar o ar de sua (des)graça.
Explico: o florescimento e a frutificação da taquara é uma super dose de proteína nos pequenos mamíferos que vivem em função das sementes na floresta e, neste caso, os beneficiados foram os ratos silvestres. Começaram a procriar feito loucos e a população atingiu um apogeu inacreditável, rapidamente. Acontece que a semente da taquara não dura muito e os ratos, logo começam a comer seja lá o que for, uns aos outros é o limite da fome. Assim, experimentaram de tudo ao redor de casa e no rancho e nos vizinhos apareciam comentários todos os dias, do tipo: Ah, roeram a mangueira do óleo diesel da Tobata; a mangueira de água, comeram todas as abóboras plantadas; acabaram com meu milho; entraram no sótão, roeram os fios da luz, do carro, e por aí vai...
Na Reserva não foi diferente, roeram até tampa de creolina, mangueira, uma lona bacana que eu usava para proteger a Toyota, entraram dentro de casa, no forro, procriaram em tudo que é canto. A cabaça da foto estava plantada e já seca quando fizeram um buraco e entraram e comeram todas as sementes, numa única noite. A cabaça devia pesar alguns quilos e ficou oca.
A hantavirose foi o pior que poderia ter atingido as pessoas, pois o primeiro caso aconteceu em Rio do Sul, com o falecimento de um homem de 35 anos. O perigo estava em aspirar ou entrar em contato com as secreções do dito rato, o que levou à morte algumas pessoas.
Bom, voltando para a cabaça, depois que tudo voltou ao normal, dependuramos a cabaça furada numa árvore perto de casa, para que algum pássaro fizesse um ninho, pois parecia ser aconchegante.
Demorou e quem se aproveitou foram os marimbondos. Porém, eu e a Gabi, diferentes de todos os que nos visitaram a partir desta data, aconselhando tocar fogo antes que virasse uma catástrofe, resolvemos conviver com a nova família só para ver no que iria dar.
Teve um dia que uma nuvem absurdamente grande de marimbondos tomou conta da casa, mas nós, nem aí, nem fechamos as janelas, confiantes de que eles estavam só dando um passeio, aproveitando o dia de sol. E foi isso mesmo o que ocorreu, nada de mais.
Convivemos com a família durante mais ou menos um ano e depois de outro grande enxame, a galera resolveu dar no pira, sem se despedir e deixou de presente uma cabaça com uma boca moldada por uma resina super resisitente em forma de turbina, recheada por uma colméia de arquitetura magnífica.